Por que escrevemos?
 



Cronicas

Por que escrevemos?

Afonso E. G. Markmann


Atravessando os portões da mente e velejando a maré da consciência, encontra-se um lugar onde tudo aquilo que sentimos e pensamos se mistura em uma linda e confusa amalgamação etérea.

Complicado e ainda por cima pseudopoético. Basta dizer que precisamos olhar para dentro de nós mesmos para entender quem somos. Simples o suficiente, certo? Agora, se alguém lhe pedisse para descrever aquilo que você viu ao fazer isso, provavelmente teria a impressão de que suas capacidades cognitivas cessaram de repente. Normal. Hercúleo é o esforço de pôr em palavras exatas aquilo que temos dentro de nós. Sim, é possível escrever “intestino delgado”, mas não é disso que estou falando.

Se nos propusermos a dissecar um sentimento como a felicidade, por exemplo, sabemos exatamente como ele nos faz sentir. Agora, definir com precisão o que de fato é a felicidade se mostra desafiador. Um dicionário pode ser útil, mas não é capaz de transmitir tal sentimento através de sua definição.

E é por isso que escrevemos.

Certa vez li que, se você ler um dicionário inteiro de cabo a rabo, todos os livros que ler depois disso serão um mero remix do amansa-burro. Seguindo essa linha de raciocínio, uma inteligência artificial abastecida com todas as palavras de um dicionário seria capaz de escrever infindáveis romances. Entretanto, um computador não tem uma mente cujos portões pode-se atravessar e muito menos uma consciência com uma maré digna de ser velejada.

E é por isso que escrevemos.

Todas as nossas dores, alegrias, amores e viveres refletem quem nós somos, e nossa escrita é um resultado direto disso. Felicidade, raiva, contentamento e ciúme são conceitos abstratos cujas definições contidas por molduras pouco importam. A amargura que um escritor sente é muito melhor exposta em um capítulo de livro ou verso de poema do que pela explicação quadrada de um dicionário ou por todos os sinônimos que uma inteligência artificial conseguir encontrar. Essa amargura será lida por outras pessoas e, através das palavras do escritor, talvez descubram que é esse o mesmo sentimento que elas têm e até então não conseguiam explicar.

E é por isso que escrevemos.


Afonso E. G. Markmann, nascido e criado no interior do Rio Grande do Sul, superou seus medos de infância através dos livros de terror. Com um pouco mais de coragem, escreveu contos inspirados em lendas urbanas até lançar seu primeiro romance, Dupla Exposição Negativa. Atualmente, divide o tempo entre escrita, música e o trabalho como professor de Língua Inglesa. é aluno do Curso Online de Formação de Escritores.

 

Cadastre-se para receber dicas de escrita, aviso de concursos, artigos, etc publicados no portal EscritaCriativa.com.br